Buenos Aires, 1962. Jorge Luis Borges editava a colectânea de contos Labyrinths, no mesmo ano em que nascia Juana Molina - uma metáfora para o que seria o seu futuro. Rodeada por um ambiente familiar musical, aos cinco anos de idade o seu pai ensina-lhe a tocar guitarra, e aos nove dá-lhe a ouvir a banda de Robert Fripp, os King Crimson, que assume actualmente como a banda que a mais influenciou e despertou precocemente para complexas melodias. Em 1976, os seus pais exilam-se em Paris devido ao Golpe Militar na Argentina. Molina só regressa a Buenos Aires seis anos depois, entrando para a Universidade, ao mesmo tempo que se estreia como actriz televisiva, protagonizando alguns programas cómicos de relativo sucesso como La Noticia Rebelde e Juana y sus hermanas, que serviam para lhe pagar a renda e as lições de guitarra. As portas do labirinto em que Molina tinha entrado pareciam estar a aferrolhar-se progressivamente. Esquecera a música durante anos… Mais do que um golpe de estado, Molina engravidou, e isso mudou tudo. Voltou a encontrar-se com a guitarra e consigo mesma. O disco de estreia não tardou. Rara (1996), foi o seu primeiro álbum, porém, ainda mantinha colada a si a imagem da jovem actriz de comédia. Nos seus primeiros concertos, a plateia gritava para que interpretasse personagens da sua carreira televisiva, como a da estranha rapariga coreana… Pouco e pouco a audiência que procurava a Juana Molina actriz foi-se dissolvendo, ficando somente os que realmente apreciavam e compreendiam o seu novo rumo artístico. Mas as rádios de Buenos Aires mantinham-se em silêncio, e os acordes da sua guitarra pareciam que estavam destinados a uma gaveta funda. Pouco tempo depois um amigo avisa-a que havia quem gostasse das suas canções, na verdade, estavam a ser transmitidas numa rádio na distante Los Angeles. Foi como um murro no estômago de felicidade, Molina compreendeu que tinha de sair de Buenos Aires e respirar o ar que bafejava as suas canções. Mudou-se para Los Angeles.
Entretanto, a sua carreira musical consolidou-se com a edição de Segundo em 2000 (Best World Music Album 2003 pela Entertainment Weekly), Tres Cosas (2002) e em 2006, Son. Um conjunto de discos em crescente, no que diz respeito à sua técnica de escrita e composição marcadas pela subtileza na guitarra acústica e os apontamentos de uma electrónica discreta. Tudo serve como inspiração para a composição de uma canção sua, os pássaros de Buenos Aires, o zumbido de um elevador velho, ou uma simples progressão de três acordes repetidos até à exaustão. Molina amplia as suas composições recorrendo a loop stations, como uma criança que repete o seu nome infinitamente até ele perder o significado e ficar mais próximo de um som bruto e original.
Un Dia (Domino Records, 2008), é o seu último disco, e representa uma abertura rítmica da sua sonoridade, como a Molina afirma: bring it to the front, like a hidden layer in Photoshop. Um fio de ritmos hipnóticos que percorrem todos os temas de Un Dia, acompanhados por loops vocais que densificam os temas e funcionam como prolongamento das suas batidas suaves. A faixa de abertura dá título ao disco e revela a entrega incondicional de Juana Molina à música, à sua vontade de inovação, e fundamentalmente, ao desejo que as suas melodias tenham a força necessária de inspirar quem as ouve: "Un día voy a cantar las canciones sin letra y cada uno podrá imaginar si hablo de amor, de desilusión, banalidades o sobre platón.”
Para escutar esta semana em Pop-up no Pop, o Construtor!
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1 comentário:
belíssimo texto!
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